quarta-feira, 27 de novembro de 2019


AS VIAGENS E O “AQUI E AGORA”


Encontrei nos meus arquivos este trecho de um diário escrito nos anos 80. Segue a transcrição abaixo.

Deixamos Bangalore às 6 da manhã. A quietude do ashram, o silêncio, o gorjeio dos pássaros. Um pássaro fez as “necessidades” em minha cabeça, enquanto eu esperava o ônibus. 

Crianças, mulheres, homens, moram em frente ao ashram. Tecem cestos de dia, cozinham à noite, dormem debaixo dos cestos.

Luta para tomar o ônibus, discussão por causa de lugar, quase briga. O povo é assim. Ônibus populares são super cheios e saem por aí balançando com 100 pessoas dentro.

 Vim com 3 malas, carregando coisas desnecessárias, minha segurança, como as tartarugas. Remédios em quantidade. Deus dá à gente aquilo que a gente precisa no momento e, no momento, por incrível que pareça, minha segurança está em tomar remédios. Procurando fora o que vai remediar dentro – remédios, remédios.
Preciso agora me descartar da mania de segurança, de remédios. Por que tantos embrulhos, pacotes, cobertores? Madras é tão quente, mas eu quase adoeci, mesmo em Bangalore, com o frio. Agora estou no calor, lembrando o frio, a chuva de Bangalore. Um ventilador e eu suando, suando. Será que as doenças não vêm do medo do entorno?

Reagir? Estar cada dia num lugar significa ter de se adaptar ao entorno. Coisas diferentes, lugares diversos.

O ashram de Ramana Maharish na cidade de Tiruvanamalai me deu a lição do que é ser “jnani”, que significa buscar a sabedoria através do autoconhecimento. “Quem sou eu?” É o mantra repetido por todos. Chegamos às 2 e meia da tarde, cansados, com fome. Fomos recebidos com a maior cordialidade. Os velhinhos andam quase nus, como Ramana. Um deles veio até nós. Convidou-nos a fazer nossa inscrição.
Almoçamos sentados no chão e o velhinho nos serviu. Alto, os pés inchados, os olhos transmitindo paz. Colocou no chão o prato de folha. Veio um jovem moreno com arroz, verduras, coalhada, leite, água. Há a preocupação de SERVIR. Reparei isto – poucas palavras, mas o exemplo da verdadeira “Jnana Yoga”, Yoga da Sabedoria. Tudo é baseado no autoconhecimento. Somos iguais. O hóspede é visto como parte do Todo – parte de nós mesmos. Outra nota: primeiro o bem estar do hóspede. Não há uma organização a preservar. Chegamos com atraso de 2 horas e fomos servidos com o maior carinho.

A tônica é o SILÊNCIO. Escutar o SILÊNCIO. O conhecimento intelectual nos coloca falando, falando. O conhecimento de nós mesmos nos conduz ao silêncio. Paz. Não há necessidade de grandes explanações, mas a gente sabe que ali moram sábios.

*Fotos da internet

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terça-feira, 19 de novembro de 2019



POSTES DE LUZ


Quando eu era menina, gostava de soltar papagaios na rua. Era um prazer vê-los subir, ganharem os céus, seguirem o vento, sustentarem-se no ar. Fazíamos nós mesmos os papagaios de papel de seda e a disputa entre os amigos era de ver quem chegava mais longe, mais perto do céu.

 Mas, os postes e fios elétricos significavam sempre a morte dos papagaios. Impossível salvá-los das correntes elétricas: também havia o perigo de puxá-los, restava apenas assistir à sua decomposição no tempo, as cores desbotando com a chuva, as caudas sendo arrancadas pelo vento. Este foi o meu primeiro contato com os postes da CEMIG. 

Depois eles voltaram insistentemente nos meus desenhos e assumindo significados diferentes de acordo com a época, e a vivência do momento.

Vieram de longe, acompanhando o meu caminho na arte. Significavam a cruz da Via Sacra, a forca de Tiradentes, a guilhotina da Revolução Francesa. Receberam cores nas Cidades Iluminadas e nos barcos, morreram na minha fase de Guerra.

Em outro painel, realizado para um grupo escolar no bairro Céu Azul em Belo Horizonte, os postes ganharam um significado lúdico. Transformaram-se em torres e castelos. Parecem pagodes chineses, lanternas iluminadas. 

As estórias da infância estão sempre exercendo um efeito mágico sobre minha arte. Relacionei o conteúdo do painel com as mil e uma noites e ele saiu espontâneo e descondicionado. Não existe separatividade entre o que ficou marcado na infância e o que estamos vivenciando no presente. Arte e vida estão ligadas no eterno agora.

*Fotos de arquivo

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terça-feira, 5 de novembro de 2019


GOA ÍNDIA PORTUGUESA XII


Se eu quiser
Que a minha
Energia suba
E se purifique
Não preciso
Fazer ginástica
Nem concentração
Nem respiração.
Apenas paro
E desenho.
Aos poucos
A paz me envolve.
Muitas vezes a
Paz nos chega
De repente
Quando nos absorvemos
Na paisagem.
Quando deixamos  
De querer
Alcançar
Qualquer coisa.
Além da mente
No silêncio
Não existe esforço.
A paz nos chega
Como uma benção
No momento devido.
Nesta hora 
Somos tudo
E somos nada.

*Ilustrações de Maria Helena Andrés

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