Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
domingo, 20 de julho de 2014
SÃO FRANCISCO E A GRUTA DELLA VERNA
Um
almoço inesquecível
Uma mesa posta ao ar livre, entre árvores e flores,
travessas de peixe com leite de coco e banana, arroz, salada, vinho e até um
guaraná antártica. Ao redor crianças brincando de roda, homens e mulheres
jovens conversando sobre o dia a dia, a escola onde trabalham e principalmente
sobre crianças. Estamos na casa de Sérgio e Martina, amigos de Teresa e Alberto.
A turma que aqui se reuniu faz parte de uma “tribo”
de professores da Escola Valdorf, situada em Colle onde Teresa e Alberto
lecionam. Considerada uma das pedagogias mais avançadas, ela adota formas de
ensino e currículos bem diferentes dos tradicionais, com o professor
acompanhando durante muitos anos a mesma turma de alunos. Torna-se um mestre,
quase um tutor, uma referência de vida para seus alunos. Hoje eles conversavam sobre crianças, sobre o melhor
para elas, sobre a importância delas serem felizes e não somente aprenderem
coisas, serem um depósito de informações.
Conversamos também sobre motivações para mudanças.
Segundo Sérgio, atualmente aqui na Europa, fatores que provocam mudanças de
vida não são apenas transferências de emprego ou ganhos de salários, mas
sobretudo a realização pessoal: o encontro amoroso com “a pessoa certa”, o
melhor lugar para se criar um filho.
Gruta Della Verna
Toda viagem costuma ter seu ponto máximo, ponto de
virada que coincide com emoções fortes causadas por visões de uma natureza
impactante, dessas de "tirar o fôlego”, a visão de uma obra de arte
grandiosa ou a sensação de paz que, por algum motivo impregna um lugar.
Hoje vivenciamos este ponto de virada quando então
podemos dizer: "chegamos, Lu, onde esta viagem tinha de nos levar. Podemos
agora voltar para casa.”
O lugar: a gruta de La Verna, onde São Francisco de
Assis recebeu, em meditação, as 5 chagas de Cristo.
Tudo começou quando recebi um email de minha mãe,
relatando uma viagem do Regis a este lugar. No dia seguinte, durante o almoço
na casa de Sérgio e Martina, comentei com eles sobre esse lugar. Sérgio me
disse: "podemos ir lá, eu também quero conhecer”.
Hoje foi este dia, um passeio por uma parte da
toscana que nunca iríamos conhecer por conta própria. Por mais de 2 horas o
carro com ele, Martina e a filha pequena Fresia,
serpenteou por vales e montanhas até chegar à comuna de Chiusi Della Verna,
famosa por seus vinhedos e olivas.
Próximo ao local do santuário nossa animada conversa
foi dando lugar a um silêncio bom, natural. O santuário é um conjunto de
construções em tons de cinza e ocre, todo de pedra. Até os telhados são dessas
cores, o que nos dá a sensação de algo que se funde com a terra, com as pedras
altíssimas e com os troncos cinzas da floresta local. Tudo está construído no
alto da montanha, lembrando os lamas tibetanos. Aqui há, além da igreja e
capelas construídas em locais onde São Francisco teve visões da Virgem ou de
Cristo, locais para a residência dos frades e uma casa para a hospedagem de
pessoas de fora. Há também um restaurante, café e estacionamento. Mas para mim
o mais impactante foi a "Gruta Della Verna” entre pedras escarpadas hoje
cobertas com vegetação e florzinhas amarelas e brancas. Fomos descendo uma
escada de pedra e a gruta se revelou, um espaço de poucos metros com poucas
aberturas além da entrada. Encostada na pedra uma grande cruz tosca de tronco de
árvore. A sensação era uma mistura de emoção e de paz, quando lágrimas correm
entre sorrisos. Uma pequena fração do que deve ter atingido o santo, quem sabe
nos atingiu também? Fizemos o que viemos fazer, vimos o que nos era destinado
nesta viagem? Não sabemos ao certo, embora a sensação é de plenitude. Todo o
caminho agora é o caminho de volta. (Trecho do diário de viagem de Ivana
Andrés)
*Fotos de Luciano Luppi
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ARTISTA”, CUJO LINK ESTÁ NESTA PÁGINA.
sábado, 19 de julho de 2014
terça-feira, 1 de julho de 2014
LUCCA, CARRARA E VIAREGGIO
“Luciano está procurando um possível irmão italiano.
Leva na bolsa fotos amarelecidas pelo tempo, enviadas por seu pai Bindo Luppi e
guardadas por Anita, sua avó, desde os anos 40. Fala de namoradas que encontrou
na Itália durante a segunda guerra mundial, quando serviu como pracinha
brasileiro. Quando encontra uma oportunidade, o Lu mostra este material antigo
como uma relíquia preciosa. Muitas vezes as pessoas não mostram tanto
interesse, mas... quem sabe na próxima abordagem teremos mais sorte? De
qualquer forma este é um bom pretexto para seguir um roteiro de viagem que
segue os passos de Bindo Luppi pela região da Toscana, especialmente Lucca,
Carrara e Viareggio.
A parte
histórica de Lucca é totalmente cercada por uma muralha, construída em etapas
há séculos, com o claro objetivo de defesa. Entre ela e o lado de fora um
imenso gramado apresenta declives e túneis que, no passado deviam ser cobertos
com água. Diversos portões se abrem para o interior e neles existem pontes
levadiças dessas construídas com pontas grossas de ferro. Dentro da muralha,
Lucca apresenta a mesma característica das outras cidades medievais, casas
altíssimas com ruas estreitas e sem árvores. Dá-nos a impressão de, ao terem
formado um bloco maciço de construções, essas casas conseguiram proteger- se
umas às outras.
Hoje visitamos a igreja de San Michele, o teatro Del
Giglio, a catedral San Martino, a Praça do Anfiteatro e a casa onde nasceu
Puccini. É sem dúvida emocionante visitar tantos lugares, caminhar por essas
vielas estreitas e sentir-se como um personagem de Brueguel. Mas a emoção maior
aconteceu ao caminhar pela muralha de Lucca. É larga como a passarela de um
parque, e há espaço para a passagem de um carro. Tem passeios laterais de onde
se avista os lados de dentro e fora da cidade. Esta passarela é toda
arborizada, as árvores encontrando no alto suas copas, como arcos de catedrais.
Embaixo pessoas caminham, correm, fazem ginástica, empurram carrinhos de bebês,
crianças pequenas brincam em play grounds e muitos pedalam, alguns em
bicicletas duplas. Vimos muitos velhinhos e velhinhas pedalando com uma
desenvoltura enorme.
Ao longe montanhas nevadas? Não, aquilo branco entre
as montanhas não está no cume delas, mas na base, no sopé dessas montanhas que
formam uma verdadeira cordilheira. O que vemos nessas montanhas a caminho de
Carrara é puro mármore. Na estação central de Viareggio, cidade balneária entre
Lucca e Carrara, as paredes, os bancos, as escadas são todas revestidas com o
autêntico mármore de Carrara. Tudo branco com veios amarronzados. Sim, as
montanhas são de mármore. O trem acaba de passar por "Forte de Marme” e
começa a surgir uma série de indústrias que processam o mármore: pedras brutas,
cortadas em blocos, em pequenos seixos e até pó de mármore. Além disso,
caminhões, esteiras rolantes, guindastes. As indústrias estão dos dois lados da
ferrovia e avançam para o interior da cidade.
Bem defronte à estação de Carrara se abre uma
montanha minerada. São crateras abertas há séculos mostrando suas vísceras
brancas. Entre a estação e esta montanha uma mineradora com suas máquinas.
Segundo o nosso guia turístico, um livro sobre a Toscana, há mais de 2000 anos
o mármore é extraído dos Alpes Apuanos e embarcado no grande porto de Marina de
Carrara. Pelo que pudemos observar hoje a cordilheira branca tem provavelmente
mais 2000 anos de exploração pela frente...
Tentamos encontrar o centro da cidade para ver o
museu, o palácio, a catedral. Tínhamos que tomar um ônibus ir para outro lugar.
De repente o Lu me disse: "vamos voltar, passar o resto deste dia em
Viareggio”. Concordei. Depois ele confessou: "sinto este lugar meio
pesado. “Adeus, vovó, você fez bem em ir para o Brasil”. Aqui em Carrara nasceu
sua avó Anita, que no Brasil encontrou com Calixto seu avô, nascido em Modena.
As famílias de ambos se encontraram no navio, a caminho do Brasil.
Viareggio, famosa por seu carnaval, é um balneário
com sua praia de areias claras, avenida beira mar, casario que lembra casas de
São Paulo ou Rio, marina extensa, cinemas, teatro. Aqui se fabricam barcos de
passeio que são vendidos para muitos países. Alguns são escuros, uns
verdadeiros "barcos de batman”. Da época medieval só restou uma torre.
Luciano
procurou uma certa rua em Viareggio, seguindo anotações deixadas por seu pai.
Ninguém, nem mesmo um velhinho simpático que queria muito ajudar, se lembrou
daquela rua. Afinal um taxista arriscou um palpite: era em Nozano, um vilarejo
perto de Viareggio.” (Ivana Andrés, diário de viagem à Itália, 2014)
Fotos de Luciano Luppi
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