domingo, 31 de março de 2024

MEMÓRIAS DE UMA EX-ALUNA

 

Naquela noite de 1944, Belo Horizonte estava passando por uma renovação. A Semana de Arte Moderna já completava a sua maioridade e Belo Horizonte ainda estava seguindo os padrões do Academismo.

22 anos de diferença e a renovação acontecia.

Estamos sob o governo de Juscelino Kubitschek. A Pampulha abria as portas para o modernismo com a construção do conjunto da Igreja,  Iate Clube e a Casa do Baile. Em BH faltava uma escola de artes moderna.  Foi quando Juscelino convidou Guignard para liderar as novas idéias, vindas de São Paulo e do Rio. Convidou para este trabalho renovador uma equipe do mais alto gabarito.

Eu era uma jovem estudante de arte que estudava no Rio com Carlos Chambelland e sonhava com o modernismo. Me vejo subindo a rua da Bahia com o crítico acadêmico do Estado de Minas, professor Roberto Frank.

Ele me dizia: " Você não vai mudar, você já é conhecida e premiada nos Salões de Arte do Rio e de BH."

Pensei comigo mesma

 " Gosto das idéias modernistas, propondo renovações. O Academismo não renova, está parado, só lembrando o passado. "

Naquele momento eu mudei. Comecei do "zero ". Logo no primeiro dia de aula o Guignard me surpreendeu. Estimulava o Novo, o não condicionado  pelo tempo.

Ver o Novo e saber conduzi-lo era uma das propostas de Guignard.

BH vivia momentos importantes, um ponto de mutação.

Naquela noite, na rua da Bahia, no prédio onde hoje está o Museu da Moda, surgia um marco decisivo na história das artes em Minas. A partir daquele momento, os artistas de Minas Gerais tomaram posição definitiva na história, criando e renovando. Guignard incentivava a criação e ao mesmo tempo exigia disciplina.

Nas aulas, o lápis duro era o mestre condutor.

"Nada de borracha "

"Você deve observar a natureza, seja ela uma pessoa física, um retrato ou uma paisagem. "

"Observar o que você vê, sem pressa de acabar. "

Fazíamos então retratos "do natural", nada de cópias fotográficas. Levávamos dias seguidos no trabalho de um retrato, procurando trazer para o papel o que estávamos vendo.

Ao lado disto, Guignard nos conduzia também à linha contínua que trazia a liberdade de expressão, sem condicionamentos. Partir de um ponto e regressar ao mesmo ponto. Com este ensinamento eu pude realizar projetos de escultura e pinturas de quadros construtivos, sem preocupações, buscando novos caminhos e direções na arte.

 

Bom dia, Guignard!

Estou com 101 anos de vida e até hoje sigo as suas orientações.

Obrigada, mestre!






 

FOTOS DE ARQUIVO

 

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