segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O CASTELINHO


Na década de 20, a Avenida Afonso Pena já cortava a cidade de Belo Horizonte de Norte a Sul,e foi ali que meu pai, o então advogado e político Euler de Salles Coelho, escolheu um terreno em forma de triângulo, com o vértice apontando para a Serra do Curral. Construiu uma casa de dois pavimentos, janelas abertas para a avenida, portas altíssimas, varanda e uma imponente escadaria onde os filhos mais tarde escorregavam pelo corrimão.
Seus primeiros filhos ali nasceram. A parteira Deolinda chegava misteriosa, e, aos olhos assustados das crianças, mais um recém nascido gritava de madrugada.
O terreno em forma de triângulo não era grande, mas, devido a sua localização entre duas ruas, proporcionava novas construções. Duas novas casas foram construídas e o Castelinho, no vértice do triângulo, em estilo colonial mexicano, serviu de moradia para a minha família na década de 40.
O Castelinho desde o começo teve uma história feliz.
Ali meu pai tinha um grande escritório com livros até o teto, e eu podia também ter o meu primeiro atelier de pintura. Colocando o cavalete na varanda eu pintava a derrubada das árvores da Avenida Afonso Pena, o contorno majestoso da Serra do Curral e a paisagem de Belo Horizonte, naquela época ainda com poucos edifícios.
O Castelinho possuía pequenas varandas em estilo mexicano e um vitral dando para o poente, representando um veleiro em alto mar. Quando descia a escada eu sempre parava para contemplar os reflexos coloridos do vitral.
Hoje o Castelinho não existe mais, mas o vitral está comigo no Retiro das Pedras, dominando a paisagem. De dentro de casa posso ver o mar continuando nas montanhas.
As coisas não acontecem por acaso. A minha série de barcos, e, mais tarde o meu interesse em descobrir o caminho das Índias talvez tivesse o seu início neste vitral, representando a aventura dos navegantes.
Iniciei a minha vocação artística junto a meus pais, na casa da Av. Afonso Pena. Artistas e críticos ali freqüentavam. O próprio mestre Guignard vinha me visitar quando descia a Avenida em direção ao parque.

Quatro casamentos aconteceram naquela casa: o meu, da minha prima Lulude e o das minhas irmãs, Lourdes e Maria Regina.

Em julho de 1947, casei-me ali com o Luiz. Uma festa simples comemorou o evento. Ocupávamos o porão da casa, onde nasceu, um ano depois Marília, minha filha mais velha. Nessa ocasião o Castelinho  celebrava o casamento de minha irmã, Lourdes, com o jornalista Wilson de Figueiredo e, muitos anos depois o casamento de Maria Regina e Azulino.

Os noivados eram celebrados com festa e foguetes. Os casamentos das moças traziam a sociedade e a família para eventos felizes, regados a vinhos e champagnes.

Sempre morei naquela redondeza e meus filhos foram criados ali.
Eram três casas acolhedoras, onde pais e filhos, netos e bisnetos encontraram abrigo. Isto porque D. Nair, mãe de 7 filhos e avó de muitos netos gostava de se ver cercada pela família. Adorava festas de aniversário, cantava e dançava junto com os jovens e as crianças. As casas assistiram a todos esses eventos e sua memória será guardada com gratidão por todos que ali puderam conviver.

*Fotos de Luiz de Salles Coelho

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