sábado, 18 de janeiro de 2014

UMA FILMAGEM NO MÉXICO

Em 1967 viajei com Ivana, então com 16 anos para os EUA, afim de realizar uma exposição em Washington. Incluimos o Peru e o México em nosso roteiro de viagem e tivemos a sorte de, no avião, encontrar uma equipe da rede Globo, que iria filmar a novela “Carlota, a rainha louca”. Natália Timberg, protagonista daquela novela continua, com a mesma simpatia e competência, a atuar na novela “Amor à vida”. Ivana escreveu um diário de onde retiramos a página abaixo:
“Escrevo do avião, a 10.000 m de altitude, voando para o México e daqui a pouco faremos escala em Bogotá . A noite caiu e a paisagem é um misto de cinza e preto. Viaja conosco o Hamilton Fernandes, que está com outros  artistas da rede Globo, inclusive Natália Timberg. Eles acabaram de fazer a novela “O direito de nascer”, sucesso estrondoso em todo o Brasil. Por um puro acaso estamos juntos neste vôo. Hamilton Fernandes fez o personagem Albertinho Limonta e todo o Brasil se apaixonou por ele. É claro que estou doida para bater um papinho com ele. Viaja conosco também o conhecido político Carvalho Pinto e na nossa frente estão a filha dele com o marido. Ambos são muito bonitos e simpáticos e conversamos com eles durante muito tempo.
Tínhamos saído do Peru com céu nublado e no aeroporto tivemos uma experiência que será inesquecível, um dos momentos de maior aflição de minha vida. Chegamos muito chiquitas, eu de peruca curta e vestido vermelho e mamãe de preto e branco com gorrinho branco à La Jaqueline Kennedy. Sentamos nas nossas cadeiras dentro do avião e esperamos um tempão. Só na última hora vimos que não tínhamos o visto peruano, perdemos o papel mais importante. A aeromoça berrando à saída do avião e o pessoal da Varig correndo de um lado para outro e eu atrás deles, como uma barata tonta. Telefonaram para a Varig do centro de Lima, pois pensávamos ter esquecido os papéis lá. Quase perdemos o vôo. Afinal abriram uma exceção para nós e deram-nos outro documento.  (Horas depois encontramos o visto. Estava o tempo todo conosco, junto dos nossos corpos, numa bolsa costurada em nossos soutiens!) Mamãe, depois de uma aflição tem uma reação muito engraçada: começa a contar o caso para todo mundo e com isso foi até consolada pelo Carvalho Pinto. Enfim, o mais importante é que não perdemos o avião e nossa escala no Panamá valeu-nos um rádio, uma máquina fotográfica e perfumes franceses. Mas o que achei o máximo, foi o contato que tivemos com a equipe de teatro brasileiro. Gentis, falantes, que vivem no momento presente a sua maior glória. Estão no seu apogeu e têm consciência disso. Conversamos um tempo enorme com um deles, Helli, muito culto, já visitou a Europa muitas vezes, faz cenários e pinturas em telas. Batemos longos papos sobre arte e filosofia.
Os brasileiros ficaram no Hotel Romano e à noite fomos vê-los. É uma equipe espetacular, um poeta (Rubens), Helli (pintor e filósofo), um escritor (Silvan, marido da Natália Timberg), Valtinho (gozadíssimo, diretor da novela), Hamilton Fernandes e a própria Natália Timberg. O restaurante do hotel Romano é uma belezinha e jantamos lá com todos eles. Um ambiente acolhedor, teto de palha, orquestra tocando algumas músicas brasileiras, luz de boîte e eu e mamãe num grupo genial, vivendo uma experiência que nunca pensávamos ou esperávamos viver. Jantamos com eles e bati um papão com Helli. Uma coisa importantíssima: dancei com o Albertinho Limonta! Conversei muito com ele, muito boa praça, apenas um tanto triste.
No dia seguinte procuramos a equipe da Globo, doidas para ver as filmagens da abertura da novela “Carlota, a rainha louca”. Eles vieram ao México para fazer esta abertura, depois de todo o sucesso da outra novela, “O direito de nascer”. Só muito mais tarde conseguimos encontrá-los, no palácio do antigo imperador Maximiliano, atualmente museu histórico. Encontramos todos já com figurinos “de época”, Hamilton de capitão, Rubens de Maximiliano e Natália com um vestido lindo, dourado até os pés, como a imperatriz Carlota. Por não haverem outras mulheres na equipe, nos oferecemos para ajudar a Natália com o figurino. Veja só, acabamos apertando o espartilho da Natália Timberg! Ela é muito culta, fala 7 línguas, mas ao mesmo tempo é simples, afetuosa. Assistimos às filmagens e observamos o quanto de trabalho dá para se fazer uma única cena. Às vezes ela tem de ser repetida 5 vezes! Vimos Natália Timberg subindo e descendo uma escadaria enorme para cada filmagem. Tiramos fotografias junto deles naquele palácio maravilhoso, tudo numa riqueza impressionante, candelabros e lustres de cristal, muros de pedra e jardins lindíssimos, ouro e prata espalhados por toda parte.
Poucos anos depois eu iria ter a notícia da morte do Hamilton Fernandes, o nosso tão querido Albertinho Limonta, num acidente de avião...

*Fotos de Maria Helena Andrés e da internet

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