Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
terça-feira, 28 de abril de 2015
A MUSA PARADISÍACA DE THOMAS NÖLLE
No
último dia da exposição “Fotografia e Natureza”, recebemos a visita de um casal
de artistas, Claudia Giannetti e Thomas Nölle.
Claudia
é professora de arte e novas tecnologias em Barcelona e Évora, e ele, artista plástico,
pesquisador, fotógrafo, com obras exibidas na Alemanha, Brasil e Espanha.
Thomas
nos mostrou um livro de artista de sua autoria, com fotos recolhidas das
janelas dos ônibus, trens e aviões.
A
rapidez do foco permitiu a realização de fotos de grande beleza, onde a forma
desaparece e resta somente cor e luz. Ali, a fotografia se aproxima de quadros
abstratos e sentimos afinidade com os meus quadros informais.
Daquela
visita, ficou a lembrança deste álbum de artista que mostrava a leveza e a
sensibilidade do fotógrafo. O próprio movimento da câmera criou luzes, sombras
e cores com a velocidade exigida pela viagem.
Mais
tarde Thomas me presenteou com outro livro de sua autoria, denominado Musa x paradisíaca.
Estou
com o livro nas mãos e posso apreciá-lo mais de perto.
O
livro é uma viagem interna que descreve o nascer e o morrer. Vou percorrendo as
páginas e sentindo a presença do fotógrafo, desta vez como observador da
natureza.
Observar
o desenrolar da natureza é também observar o ciclo de nossa própria vida.
Neste
segundo livro, Thomas fotografou o ciclo de nascimento de uma das árvores mais
populares do Brasil – a bananeira.
O
artista Thomas Nölle, fotografando o livro Musa x paradisíaca nos mostra como a
atenção na natureza pode nos conduzir a percepções sobre o sentido da vida.
“As
fotografias de Nölle põem em evidência, de forma generosa como poucos sabem
fazer através de imagens – que cada etapa do processo vital dos seres para
perpetuar a espécie se faz acompanhada de uma determinada estética: orgânica e
sensual, algumas vezes, insólita e fantasmagórica, outras vezes”. (Citado por
CN na introdução do livro do artista)
Existe
beleza na primeira folha que se impõe solene como uma escultura verde e no
desenrolar de outras que crescem, obedecendo a uma certa ordem. Há simetria nas
primeiras flores que surgem nesse processo de renascimento.
Este
pequeno livro nos mostra, através de imagens, as diversas etapas do processo
vital de uma simples bananeira e nos conduz à beleza de cada fase de seu
crescimento.
Thomas
vêm sempre ao Brasil e já percorreu vários países da América do Sul e de modo
especial a Amazônia, onde teve contato com os nossos índios e a nossa natureza
exuberante.
Musa
x paradisíaca é um livro de imagens que aos poucos vão se desdobrando como as
folhas de bananeira que se abrem para o sol.
*Fotos
de Thomas Nölle
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terça-feira, 14 de abril de 2015
ENCONTRO COM PABLO NERUDA EM VALPARAÍSO
12 de junho
Tiago de Melo e Nemésio Antunes, este último artista
e diretor de museu, levam-nos para uma visita à Valparaíso, cidade mais
importante do Chile. Rodamos 2 horas por uma estrada moderna e asfaltada, ladeada
de campos férteis cultivados.
O carro é um último tipo Impala e, nos intervalos de
conversas sobre arte, escutamos música sinfônica pelo rádio. Descemos ao longo
da costa até Valparaíso, cidade antiga, tipicamente colonial, com a arquitetura
que lembra às vezes Ouro Preto.
Tiago nos leva até a casa de Pablo Neruda, que nos
espera para um drink. De longe o primeiro impacto: a arquitetura da casa
subindo morro afora, cheia de cores variadas e bizarras. À porta, logo de
entrada, surpreendeu-nos um imenso cavalo branco de madeira com o rabo virado
para o visitante. Subimos por uma escadinha estreita, Tiago levando um presente
para Neruda – cebolas enormes, brilhantes, rosadas, em cima de uma abóbora
comprada na feira – isto é presente que se leve para um poeta?
Mas Neruda é o poeta da terra, já fez uma ode à
cebola num de seus livros. Recebe-nos alegremente, leva-nos a tomar wiskey em
seu barzinho. Matilde, sua terceira esposa é cheia de vida, sorri para todos e
oferece a Tiago um regalo em papel prateado, embrulhado em fita rosada. São versos
do Tiago, traduzidos para o castelhano. O ambiente é cordial e alegre e a
exuberância do adido cultural brasileiro mistura-se à gentileza natural do
chileno.
Vamos até um restaurante em frente ao mar, onde se
pode ver o Oceano Pacífico de perto, por sobre as ondas, como se estivéssemos
em um navio. Através das vidraças divisamos os barcos atracados, as gaivotas
aos bandos sobre as águas. Comemos mariscos e peixes de sabor estranho, ainda
não experimentados. Neruda come camarões e Regina em sua frente divide o prato
com Nemésio.
Matilde, a mulher de Neruda, recita em voz sonora os
poemas de Tiago. Deve estar habituada a isto e os poemas de Tiago em castelhano
ganham uma sonoridade diferente. “Los barcos naciem, como naciem dolores.”
Ficamos emocionados com os versos e a ênfase dada
por Matilde às palavras do poeta. Escutamos por 15 minutos até que Tiago,
eufórico e comovido, levantou-se e beijou a mulher de Neruda. Enquanto isso, o
grande poeta chileno continua a comer camarões...
Depois do almoço o programa continua, sem Neruda e
esposa. Vamos conhecer o Centro Brasileiro de Valparaíso, situado no 2° andar
de um edifício na zona central da cidade. A sala ampla, com painéis modernos
exibe fotografias de jardins de Burle Marx. Meus quadros serão expostos nesta
sala daqui a um mês, quando terminar a exposição de Santiago.
De volta a Santiago, Juita e Fernando nos esperam no
quarto para saber das novidades. Todos os dias vamos ao quarto do embaixador
doente, que fica sempre muito contente de nos ver. A bondade de Fernando, sua
simpatia pessoal e senso humano faz dele um embaixador querido e estimado por
todos. Não há chileno que não o conheça, nem lhe preste homenagem, desde o
mordomo da embaixada, até a mais simples criança de escola primária. O Brasil
conquistou um grande caminho na solidariedade das nações irmãs da América
Latina, colocando à frente dos interesses nacionais nestes países, estes dois
brasileiros, Fernando Alencar e Tiago de Melo.(trecho do diário de viagem ao
Chile, 1963)
Transcrevo abaixo alguns versos de Pablo Neruda:
O Teu Riso
Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas
não me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a flor de espiga que desfias,
a água que de súbito
jorra na tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
por vezes com os olhos
cansados de terem visto
a terra que não muda,
mas quando o teu riso entra
sobe ao céu à minha procura
e abre-me todas
as portas da vida.
tira-me o ar, mas
não me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a flor de espiga que desfias,
a água que de súbito
jorra na tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
por vezes com os olhos
cansados de terem visto
a terra que não muda,
mas quando o teu riso entra
sobe ao céu à minha procura
e abre-me todas
as portas da vida.
Fotos da internet
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