Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
sexta-feira, 20 de janeiro de 2012
ROMA,VATICANO
Visitamos o Vaticano à noite. Atravessando a ponte que conduz ao Castelo de St. Angelo, onde viveu Lucrécia Bórgia, pode-se ver de longe a cúpula da basílica de São Pedro, muito branca, dentro da noite. Inúmeros arquitetos estiveram à frente de sua construção, cabendo a Miguel Ângelo a criação da famosa cúpula e, a Bernini, o projeto circular monumental, com a basílica no centro de imensa praça, ladeada de colunas de pedra. Emociona, à primeira vista, o espaço entre as colunas, que se elevam enfileiradas circundando o palácio do Vaticano e a Basílica de São Pedro. A grandiosidade da praça vazia, vista à noite, entre sombra e luz, toma um aspecto fantástico, irreal e comove ao primeiro impacto.
Volto a São Pedro durante o dia. O interior da basílica decepciona. Há uma mistura de estilos, o individualismo e a vaidade prevalecendo. O que um artista começou foi modificado por outro, e a basílica enorme, requintada, excessivamente enfeitada, perde pelo excesso de decorações; mármore, ouro, colunas renascentistas, altares barrocos, tudo procurando sobressair, mas contribuindo para desvalorizar algumas das grandes obras ali expostas, tais como a “Transfiguração” de Rafael e a “Pietá” de M. Ângelo.
Universalmente conhecida, esta imagem comove o mundo, apesar da colocação desfavorável dentro da basílica. Há uma expressão de ternura que se desdobra através do manto, o abandono do Cristo, a suavidade de contornos do rosto de Maria.
A expressividade em arte não descreve, nem analisa, mas desperta o sentimento estético, como a música. Atinge diretamente a alma e não a inteligência. Talvez por isso, sem ser dramático nem apelar para o trágico, Miguel Ângelo comove pela profundidade expressiva. A Virgem Maria parece uma jovem de 18 anos. Talvez Miguel Ângelo não quisesse esculpir a realidade dos fatos, mas eternizar o amor materno, que é grande e puro e não sofre a ação do tempo. Através da arte, os sentimentos humanos são transmitidos: o amor ou o ódio, a espiritualidade ou o materialismo, a violência ou a paz. Em frente ao mármore rosado da Pietá, o viajante se detém, atingido pela força de expressão de um dos sentimentos mais nobres da pessoa humana.
Combinamos uma visita ao Vaticano, para ver o museu e a Capela Sixtina. Recebe-nos o conservador-chefe do museu do Vaticano, Sr. Redig de Campos. Leva-nos até a sala de Rafael, onde explica detalhes interessantíssimos dos afrescos, que foram pintados pelo artista com a idade de 24 anos, no princípio de sua carreira, estimulado pelo papa Júlio II, descobridor de gênios. Entusiasmado com o talento do jovem Rafael, o papa Júlio deu-lhe a encomenda dos afrescos, mandando cobrir as pinturas originais de Piero de la Francesca !...
Isto nos lembra as injustiças que em todas as épocas se comete, quando, em detrimento de outros valores, visa-se promover uma nova revelação.
Recentemente, o serviço de conservação do patrimônio artístico do Vaticano foi mobilizado para a restauração da obra de Rafael. As películas de tinta foram retiradas por um processo especial e, nessa remoção, descobriram trechos da pintura anterior.
No meio de todos os tesouros do Vaticano destaca-se, pela força de uma arte madura e expressiva, a Capela Sixtina, pintada por Miguel Ângelo. O poder de criação do artista manifesta-se nesta obra de modo violento; dinamismo e tensão aumentando a capacidade expressiva do conjunto. Ao centro de um grande círculo de penitentes em expectativa, o Cristo, braço direito erguido, tendo a seu lado, como intercessora, sua mãe, julga a humanidade e separa os bons dos maus. O desenho barroco de M. Ângelo movimenta as figuras, estruturando-as num todo, onde os contrastes de luz e sombra dão relevo quase escultural. Miguel Ângelo, o pintor, convence tanto quanto o escultor, principalmente por seu caráter de monumentalidade. Talvez este Juízo Final e o teto decorado com cenas bíblicas seja o conjunto mais belo, mais impressionante, de todas as obras primas que se acham em Roma.
*Fotos da internet
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sábado, 7 de janeiro de 2012
ROMA, CATACUMBAS
Estamos nas catacumbas, lugar onde se escondiam os primeiros cristãos, fugindo das perseguições religiosas. Penetramos em longa fila de turistas à luz de tochas e velas, através das escavações subterrâneas. Nos nichos, nas pequenas capelas clandestinas, na sala de reuniões onde celebravam missas, os cristãos distribuíam o pão e faziam suas pregações religiosas. A grande força de uma fé inabalável está gravada na pedra em grego, latim e hebraico e ressuscita nas sombras projetadas nas paredes, nas alcovas descobertas e nas inscrições dos mártires. No alto, onde estão sepultados os nobres romanos, que clandestinamente pertenciam ao cristianismo, Constantino construiu a igreja de São Pedro e São Paulo, agora transformada em igreja de São Sebastião, o mártir. Alcançamos, através do subterrâneo, a sala de recolhimento onde os cristãos escreviam seus apelos aos apóstolos Pedro e Paulo. Um padre à frente explica, e dificilmente conseguimos conter as lágrimas. Como pôde um povo ser tão despojado, tão desprendido do amor à vida e às coisas materiais? Se fossem descobertos, seu destino seria o Coliseu e as feras. O silêncio emocionante nos faz esquecer que estamos no século XX e que o materialismo invade o mundo cada vez mais. Nestas pedras estão inscritas as orações dos primeiros cristãos. E ouvimos o padre explicar em bom inglês: “Aqui, as famílias perseguidas dirigiam suas preces a Pedro e Paulo:”
“Protegei-nos e a todos aqueles que mais tarde puderem ler o que escrevemos”. Noutro local, um pai que no dia seguinte seria lançado às feras, recomendava seus filhos aos apóstolos.
Subimos à nave da igreja, onde, num altar lateral, estão gravados, na pedra, os pés de Cristo. O impacto emocional não nos permite falar e perguntar muito. Os guias continuam a relatar indiferentemente, sem emoção, coisa tão inexplicável, tão espiritual, como foi a vida de sacrifício dos primeiros cristãos...
À saída, o ar puro e a luz do sol nos mostram novamente a Roma dos tempos modernos. Os romanos vivem a agitação do século, a civilização atual. A máquina e a tecnologia adaptaram-se perfeitamente a esta cidade, onde as cenas da história dão calor e vida. Do passado, apenas os monumentos, estátuas e ruínas. A lei do presente é outra, mudaram-se as reivindicações. Nas ruas, o protesto. “Queremos o divórcio”. Homens e mulheres levantam cartazes, afrontando a igreja. Muito sofrimento atingiu este povo que viveu a guerra de perto, passou fome e agora ressurge nos tempos modernos, à luz de novas ideologias.
Roma é o poderio da igreja católica sobre o paganismo anterior, vendo-se templos antes pertencentes aos deuses, agora transformados em templos cristãos. O Panteon enorme, vazio, rememora um passado muito longínquo de fausto e riqueza. A cúpula com uma abertura circular de 9 metros de diâmetro, deixa entrar a luz de clarabóia que ilumina o grande salão de pedra, despojado de móveis, iluminado somente por aquele círculo de luz lá no alto, cortando o céu.
O céu de Roma é azul como o céu brasileiro. Seus edifícios imponentes, pesados, têm uma longa história a contar. São casas queimadas de sol, vermelhas, quentes, como o calor da Itália, o colorido das vitrines, as blusas estampadas, as gravatas, a pele tostada dos italianos. Há barulho, vozerio, alegria, misturado ao mistério das vielas estreitas e sombrias, que parecem não dizer nada, senão pobreza, mas, de repente, como que por milagre, deixam entrever um monumento, um palácio, uma estátua, uma fonte.
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