Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016
VIAGEM AOS EUA I
Recebi de
Maurício Andrés esta síntese referente ao meu diário de viagem nos EUA em 1961.
Transcrevo abaixo trechos deste diário.
“Em 1961,
Maria Helena Andrés foi convidada pelo governo americano para fazer uma viagem
de estudos e pesquisas àquele país. A viagem durou quatro meses e ela deixou em
Belo Horizonte, sob a guarda de seu marido Luiz Andrés e familiares, seus seis
filhos, que tinham entre 12 e 1 ano de idade.
Nos Estados
Unidos, o roteiro incluiu visitas a Nova Iorque, Washington, Seattle, Cleveland,
San Francisco, Los Angeles, Phoenix, Santa Fé. Ela realizou exposições,
contatou artistas e colecionadores, universidades e escolas de arte. Comparou a
produção artística americana da costa leste e da costa oeste. Era a época da
guerra fria e o clima belicoso se refletiu em sua fase do fogo, da guerra e da
violência.
Na
Califórnia, teve o primeiro contato pessoal com as culturas asiáticas,
especialmente a China e o Japão, o que posteriormente a influenciou no seu
interesse pelos de integração entre o oriente e do ocidente, tema em que
evoluiu para se aprofundar na cultura indiana.” (Maurício Andrés)
VIAGEM AOS EUA
1961
Recebi um convite do
Consulado Americano em Belo Horizonte: tinha sido escolhida como artista e
professora de arte para visitar os Estados Unidos num programa cultural
denominado “Comitê de líderes e especialistas”. A programação, de janeiro a
maio de 1961, incluía visitas a escolas de artes, museus, galerias e contatos
com artistas de vanguarda da época. Como poderia eu aceitar uma viagem
internacional com uma família de seis filhos? Fiquei em conflito com essa
ideia, mas meu marido, Luiz Andrés, com a sua grande compreensão, me estimulou
a aceitar o convite. “Você deve ir, vai ser bom para a sua carreira. Pode
deixar que eu tomo conta das crianças”.
Dia de exposição é um dia cheio. Ninguém imagina o
quanto de cansaço e emoção nos acompanha este dia. Os flashes aqui começam
cedo. Desta vez, coincidiram com um programa na televisão. Tive de ir para lá
às duas horas, nem ao menos almoçar pude. Fiquei nos chás e torradas por falta
de tempo. Apresentaram-me a um brasileiro encarregado de me entrevistar.
Perguntas relativas à exposição e às minhas viagens, para serem televisionadas
na América do Sul, grande propaganda para mim. De todas as impressões, depois
de passado o movimento, ficaram os flashes na lembrança. Os focos luminosos
deslumbrando a sala, pessoas, pessoas, pessoas. TV, fotografia para jornais,
cinema. Tenho de fazer pose, fingir que explico um quadro, sorrir, ser fotografada
de perfil. As pessoas me rodeiam. Algumas vieram de chapéu, outras, não… Os
quadros lá estão, na parede à mostra. São apertos de mão, abraços, muitos nomes
para guardar e uma infinidade de olhos em cima de mim. Tenho de falar inglês,
português e castelhano; às vezes, falo português com um americano e inglês com
um brasileiro. A colônia brasileira compareceu em peso. Não faltou ninguém.
Muito americano, também, alguns chapéus e eu com o meu na cabeça. Não tive
tempo de me arrumar direito, o jeito foi enfiar o chapéu. De tudo ficam a
lembrança dos flashes e a dor nos pés.
*Fotos de arquivo e da internet
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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016
CARNAVAL EM BH, ONTEM E HOJE
Estou sentada na minha sala, vendo os blocos passarem. Desfilam na TV, mostrando o carnaval de rua em várias cidades brasileiras, no Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Belo Horizonte. O Brasil foi tomado de assalto pela necessidade coletiva de cantar, participar, transmitir em público a alegria natural do brasileiro. O carnaval é a forma de expressão popular que no momento está se mostrando de um modo diferente. As pessoas não ficam apenas assistindo os desfiles na TV, elas saem do seu conforto em casa, ocupam as ruas, participam, criam suas próprias músicas e fantasias, organizam blocos como antigamente. Sou do tempo do carnaval de rua, quando os foliões fantasiados ocupavam as ruas e praças de BH. Enquanto vejo os blocos atuais pela TV, vou me lembrando dos blocos de antigamente, quando eu era criança. Participei de vários carnavais. Mamãe e tia Mucíola escolhiam a fantasia e iam todos, tios, primos para o desfile do corso na Avenida Afonso Pena. Papai alugava uma limousine conversível, o motorista descia a capota e a criançada se alojava nos bancos e na própria capota, levando rolos de serpentina, frascos de lança perfume e sacos de confete. Já sabíamos de cor as músicas e saíamos cantando pela cidade, numa ocupação prazerosa do espaço público. O repertório era grande e as vozes infantis enchiam a cidade. Guardei deste recuo no tempo a sensação de alegria, para senti-la novamente nesses blocos que ocupam as ruas de Belo Horizonte. A alegria e a espontaneidade são emoções que se repetem ao longo do tempo, trazendo o passado para o presente.
O carnaval de hoje está enchendo de euforia a cidade, dizem até que está sendo o melhor carnaval que já aconteceu por aqui.
Escuto o depoimento de minha filha Marília, que participou de um bloco intitulado “Todo mundo cabe no mundo”. É muito importante caber no mundo, sem distinção de raça, credo, idade ou sexo. Um mundo em que todos são iguais. O diretor do grupo, Marcelo Xavier, anda de cadeira de rodas, mas vive alegre, cria marchinhas, faz para a criançada bonequinhos de massa. É um poeta da vida. Marcelo Xavier é conhecido na cidade e todos os anos participa do carnaval e nesse ano ele criou o bloco carnavalesco levando a bandeira da inclusão social.
Ivana também entrou em blocos que passavam pela Savassi nos três dias de carnaval. Como companheiros, levou bonecos de espuma fabricados por ela mesma. Entrou nos blocos “Dado”, “Me bebe que sou cervejeiro” e “Magnatas do samba”. Todos queriam ser fotografados com os bonecos, que mexiam a boca e cantavam as marchinhas e canções carnavalescas atuais. Uma das bonecas, a “Preta Gil” beijou e foi beijada, e o “Zeca, de Entre Rios”, estampava a camiseta do 4° Festival de Inverno Entre Rios de Minas. Não fui ao carnaval, mas meu quadro de balõezinhos ali esteve participando no corpo do boneco Zeca.
Alexandre também pintou a cara de azul, botou um turbante na cabeça e foi para o carnaval com os amigos e a namorada Luciana. Dançou e cantou celebrando Krishna no bloco “Pena de Pavão de Krishna”.
A família entrou na dança, ocupou espaços, mostrou reivindicações para a cidade. Roberto e Fernanda, participandodo bloco “Tico, tico, serra copo”, saíram com as filhas para a beira do rio, na praia do Onça, a 13 km do centro de BH, numa praia abandonada e ocupada como recanto aprazível da cidade. A proposta era a inclusão de espaços abandonados para o lazer da população.
Fiquei muito feliz de ver a minha família dando continuidade à alegria que eu também sentia quando criança, num carnaval de rua, onde todos, crianças, jovens, adultos participam espontaneamente do entusiasmo coletivo, colorindo as ruas da cidade.
*Fotos de Cecília Perdezoli, Benedikt Weirz, Marília Andrés, Heloisa Gama, Maria Antonieta Moreira e Luciano Luppi
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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016
NOVAS DESCOBERTAS NO MEU CAMINHO
Quando
voltei ao Brasil depois de uma viagem dos Estados Unidos, em 1961, a arte
abstrata levantava bandeiras na Bienal de São Paulo, com o grande premio dado a
Manabu Mabe. Eu trouxera dos americanos uma bagagem de impressões e vivências
marcantes que definiam direções para o meu trabalho. Naquele mesmo ano, havia
sido convidada a apresentar uma sala especial na Bienal, com desenhos em papel
veludo, sugerindo veleiros. Voltara dos Estados Unidos com quatro exposições
individuais no meu currículo, e uma acolhida amistosa pelos dirigentes de
museus e galerias. Naquele momento, a Bienal significava a abertura para a
fusão oriente-ocidente através da linguagem artística. Passei 1 mês em São
Paulo percorrendo a Bienal. Parava diante dos quadros do japonês Tessai, estudando sua vida e sua obra.
Ele
de certo modo significava para mim o gosto pelas viagens, a aventura de
percorrer muitas cidades, conhecer pessoas, falar línguas diferentes.
Significava a emoção da pintura, a necessidade de expressar e também a
reflexão, o silêncio e o vazio. Na pintura japonesa o vazio é necessário como é
necessário este vazio para chegarmos à nossa vivência de paz.
Tessai
percorrera 10.000 milhas andando a pé pelo Japão e lera 10.000 livros. Sua
pintura refletia algo mais que uma simples exposição emocional, mas convidava
ao silêncio, a meditação.
Agora,
revendo os meus passos no caminho, posso assegurar que este pintor japonês, foi
realmente o grande exemplo que precisava encontrar naquele momento.
Atualmente,
os meus passos pelas montanhas vão descobrindo em Minas, as paisagens do Japão.
Fotos
de Maria Helena Andrés e da internet
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