quinta-feira, 26 de maio de 2011

LUIZ ANDRÉS III


Tudo na vida tem sempre um lado de sombra e outro de luz. A generosidade do Luiz para com a família se estendia para um desapego, de não reivindicar qualquer coisa em benefício próprio, preferia sempre “ver o outro feliz”.
A dedicação, tanto à sua família de origem quanto à nossa família foi o suporte para uma realização profissional de grande fertilidade.
Em 1956, com 35 anos de idade, Luiz obteve o grau de catedrático na Escola de Medicina, sendo considerado o catedrático mais novo do Brasil.
Luiz levava susto com as minhas mudanças no campo das artes plásticas. Não dava palpites pessoais nos meus quadros, embora às vezes lhe parecessem estranhos.
Incentivava os filhos a seguirem seu próprio chamado interno sem querer dirigi-los. Nossa casa na Santa Rita Durão 432 era freqüentada por alunos de desenho e adolescentes cheios de idéias novas. Tínhamos dentro de casa uma Escolinha de Arte onde as filhas davam aula, um laboratório fotográfico onde os filhos faziam fotos  e revelavam ali mesmo, além de um Studio de cinema.
Às vezes eu precisava cercar o Luiz no portão: “Não se assuste, tem um homem de preto, sentado no sofá com um revólver na mão, não é um ladrão, é um personagem do filme do Maurício.” Ou então: “A freira que sobe correndo a rua, fugindo de um homem suspeito, não fugiu do Colégio Sagrado Coração de Jesus em frente à nossa casa. É apenas outro filme...”
Os filhos menores faziam cidades inteiras, maquetes de fazendas, tudo isto na sala de visitas (era época de chuva).
Luiz adorava vê-los criando. Mais tarde, dois meses antes de sua morte, o Artur foi presenteado com um piano: “Tenho medo que você venha a sofrer privações, a carreira de músico é muito difícil, mas vou lhe dar um piano, porque a música é tão bela!” O Artur ganhou o piano e mais tarde a flauta. O pai o incentivou às vésperas de morrer.
Em 1970 cheguei com a informação sobre uma viagem em torno do mundo organizada por uma equipe de assistentes sociais. Era uma excursão com preços muito acessíveis com o objetivo de visitar a Expo-70 no Japão.
“É importante para a sua carreira, artista tem de conhecer o mundo, não pode ficar parada em Belo Horizonte.”
Viajei e conheci o mundo e devo ao incentivo de Luiz a possibilidade de ter uma visão holística da arte e da vida. Comecei a enxergar o oriente como um complemento do ocidente. Aquela viagem ao oriente me abriu a consciência para a unidade planetária e me deu o primeiro toque iniciático na Índia. Comecei a estudar os pensadores e místicos orientais, desde Ramakrishna até Lao Tse e tornei-me vegetariana. O vegetarianismo foi difícil para ser compreendido e praticado por Luiz, se bem que não fizesse o menor obstáculo à nossa mudança de conduta. Fazíamos meditação em casa, praticávamos métodos terapêuticos orientais tais como Do-in, Shiatzu e Yoga.
Luiz não praticava, mas também não fazia o menor obstáculo e a família continuava a seguir o seu próprio caminho, muitas vezes contrariando a medicina tradicional. O respeito ao outro não deixava que ele se opusesse ao nosso despertar holístico.
Escrevi o livro “Os caminhos da Arte” na década de 70, fazendo palestras e mostrando a relação que havia entre a sabedoria milenar do Oriente e a mentalidade científica do Ocidente – “Um casamento perfeito de opostos complementares”.

Na adolescência de meus filhos, todos passamos pela experiência dos anos de chumbo no Brasil, sofremos com as perseguições e os protestos estudantis.
O registro que eu tenho dessa época de violência e medo são os meus quadros da fase de guerra. Arte e vida são inseparáveis, e, na época, minha pintura se tornou violenta também, numa forma de denunciar as torturas e as prisões.
A década de 60 foi registrada nesses quadros em preto e branco.

Incentivado por seu primo e amigo Antônio Ribeiro, compramos em 1972  um lote no Retiro das Pedras, condomínio próximo a Belo Horizonte. Luiz aproveitou pouco a casa do Retiro, pois faleceu em 1977, apenas três anos após a construção da casa. Tenho certeza, no entanto, que ele estará sempre presente aqui.

*Fotos de arquivo

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