segunda-feira, 16 de maio de 2011

SOBRE LUIZ ANDRÉS Ii

Nos primeiros anos do nosso casamento Luiz estudava para concursos e enquanto ele estudava eu pintava. Esta determinação intelectual de se aprofundar nos estudos científicos da Medicina, me estimulava também a me dedicar à minha arte totalmente, sem prejuízo da família. Os filhos foram chegando e trazendo alegria para todos. Luiz era um pai amoroso, cuidava das crianças à noite e ajudava nas mamadeiras. Nunca tivemos enfermeiras, cuidávamos sozinhos dos filhos. Para isto, abri mão dos efeitos secundários da arte, de participar de encontros sociais ou da “vida boêmia” própria do artista. Aprendi a ver que, para fazer uma arte de qualidade, o importante é o trabalho.Eu via o Luiz trabalhando e se dedicando à medicina. Também como artista eu não via nenhum empecilho em ser dona de casa e mãe de família. A arte da medicina poderia ser exercida com as atividades familiares, assim como as belas artes se estendiam a todos da família.  Arte estendida à vida, para nós, começou em casa, com nossa profissão perfeitamente integrada ao dia a dia, sem cobranças ou conflitos.Luiz adorava me ver pintar, preparava minhas telas. Esticava o pano no chassi com preguinhos, passava a tinta branca com pincel largo, esperava secar, passava outra demão. Não deixava ninguém preparar as telas, ele mesmo me entregava prontas para serem pintadas. Até hoje me lembro do Luiz vestido com avental branco de médico, preparando com carinho telas enormes para que eu pintasse. Meu ateliê na ocasião era na sede da fazenda da Barrinha e também em BH, na Rua Santa Rita Durão. As crianças brincavam perto, da janela eu podia vê-las. Luiz fazia gosto na arte das crianças, trazia papéis que sobravam das radiografias, papéis pretos e cor de laranja.Ali as crianças desenhavam as galinhas do nosso galinheiro, cada galinha tinha um nome. Luiz não gostava que os filhos saíssem para a rua, as brincadeiras eram organizadas ali mesmo, ao nosso lado, com toda a liberdade criativa. Pintar os muros era uma festa, preparávamos as tintas e as crianças grafitavam 60 metros de quintal. Quando chegavam ao final dos 60 metros, o início daquele mural infantil já estava desgastado pelo tempo e pelas chuvas e já era hora de caiar tudo para eles começarem outro painel.O ateliê de BH era freqüentado por críticos de fora, que achavam engraçado ver tantas crianças pintando, o pai preparando telas e as lavadeiras vestidas com as telas que não davam certo por qualquer motivo. Organizou uma exposição das duas filhas mais velhas na Associação Médica”. Elas eram adolescentes, uma com 13, outra com 15 anos. Na inauguração um médico comprou um quadro de cada uma, um sucesso no campo da arte. Ficamos contentes com este primeiro reconhecimento público. Depois soubemos que o médico era o próprio pai, pois anos mais tarde os quadros apareceram nas paredes de seu consultório.Luiz não me acompanhava nas minhas viagens para São Paulo durante as Bienais, mas acreditava que um artista devia se atualizar, não podia ficar parado em BH. Incentivava minhas viagens: “Você tem de conhecer os Estados Unidos, foi convidada...”Passei quatro meses fora, ele deu segurança para as crianças, ajudado por suas irmãs e mãe. Não deixava os filhos se queixarem de doenças: “Sua mãe não deve se preocupar durante a viagem”.Isto para mim foi importante, saber que a família estava bem e sem problemas.Luiz sempre supervisionando tudo e todos de forma amorosa. Cuidava também de sua própria família, resolvendo problemas dos pais e dos irmãos. Na década de 50, o Roberto, irmão mais novo do Luiz e muito chegado a ele, foi clinicar no interior e chegou a BH doente dos pulmões.Luiz convidou-o para ficar de repouso em nossa casa. Armaram um verdadeiro hospital dentro de casa, vieram a mãe e as irmãs para ajudar e eu tive de ficar dois meses morando em Entre Rios com meu sogro, por causa das crianças. Esse deslocamento familiar causou surpresa na minha família, mas era necessário e foi feito. Aproveitei a oportunidade para desenhar os boizinhos, o carro de boi chegando, cenas do interior como mulheres fofocando na rua, uma mudança a cavalo, móveis antigos, salas do tempo do Brasil Colônia, um retrospecto hoje revivido em outros desenhos de linha contínua, transformados em esculturas.
*Fotos de arquivo

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