Um casarão em Botafogo, antiga escola de
adolescentes, foi transformado no espaço cultural “Casa Daros”, recentemente
inaugurado. Visitamos uma exposição de arte contemporânea que reúne artistas da
atualidade, cada um trazendo a sua contribuição para revelar a liberdade
criativa do momento em que vivemos.
Fotografamos a sala de Yole de Freitas que sustenta
uma beleza de composição e colorido nas velas transparentes de um grande barco.
Numa sala especialmente dedicada ao Conjunto da
Maré, jovens artistas da fotografia oferecem um exemplo de como fotografar
dentro de uma latinha de leite em pó. As fotos saíram muito nítidas, todas em
preto e branco, e podem ser admiradas em pequenos quadrinhos.
Na sala em frente, uma santa toda feita de sucata,
chama a atenção do público. Ficou linda, é reverenciada por todos que aqui vêm
para apreciar esta obra de Vick Muniz. Sempre admirei a criatividade de Vick
Muniz, voltada para os problemas de nossa época. Reaproveitando a sucata que se
empilhou na reforma de uma construção, Vick criou uma Nossa Senhora das Graças,
numa reprodução feita coletivamente por aqueles que trabalharam na obra. O
resultado foi surpreendente, e ela está exposta à visitação pública nesta
pequena sala da Casa Daros. Os visitantes aqui se detêm para reverenciá-la.
Nossa Senhora das Graças, aqui revestida com manto da pobreza, do despojamento,
parece nos olhar de frente, enquanto a contemplamos. Aos poucos, vou revivendo
um trabalho realizado por mim, com a ajuda da nossa saudosa Ana Horta há 35
anos atrás, no vale do Jequitinhonha. Releio o que escrevi na época e aqui
transcrevo o texto:
Em 1978 segui com uma caravana de artistas para o
Vale do Jequitinhonha, num projeto do artista Paulo Laender. Ali, cada um teria
de se expressar dentro de sua área: música, poesia, pintura, desenho, teatro,
literatura e educação. Naquela ocasião, procurei a jovem artista Ana Horta e
juntas organizamos jogos criativos com crianças da cidade. Eram meninos pobres
da redondeza, submetidos muitas vezes a privações e catástrofes. Incentivamos
as crianças a realizarem trabalhos individuais, usando materiais da região e elas
se manifestaram com a maior espontaneidade: criaram uma imensa boneca, a qual
denominaram Mariquinha. Usaram para aquela criação coletiva gravetos, flores,
folhas e pedras da região. Mariquinha, medindo uns 5 metros de comprimento,
estava deitada no chão, com uma vassoura de folhas de palmeiras na mão. As
crianças fizeram uma roda e cantaram em torno, embalando a grande boneca com
canções de ninar.
E se as chuvas vierem? Perguntei.
“Fazemos outra Mariquinha”, responderam.
Trabalhos coletivos ajudam na harmonização do grupo
e no desapego da obra. Para aquelas crianças que assistiram suas casas
desabarem com as inundações, o momento presente era o que importava.
*Fotos de Marília Andrés e Alice Andrés.
VISITE TAMBÉM MEU OUTRO BLOG “MINHA VIDA DE ARTISTA”, CUJO LINK ESTÁ NESTA
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