Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
segunda-feira, 29 de janeiro de 2018
ACIDENTE II
As coisas se repetem na vida, é bom que prestemos
atenção nisto. São experiências com características semelhantes.
Foi em 1950, quando ganhei o prêmio de Isenção de
Júri no Salão Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro.
Estava com as malas prontas para a viagem, passagem
de avião na bolsa, quando papai veio me ver. Descera a rua Sta Rita bem cedo de
manhã para me aconselhar a não ir de avião.
“Tive um sonho horroroso com você, um desastre. Por
favor, troque a passagem não vá de avião.”
Naquele tempo, viajar de avião era considerado um
risco de vida.
“Mas, papai, já comprei a passagem”
“Não faz mal, eles podem trocar ou te dar o dinheiro
de volta, mas atenda o meu pedido, não vá de avião.”
“Está bem, vou providenciar uma passagem de trem”
Fui até a praça da Estação, consegui a passagem e
desisti de ir de avião.
No trem acomodei-me no beliche de cima, com minhas
malas aos meus pés: embaixo dormia uma senhora com uma criança de uns 5 anos.
O trem saíra de Belo Horizonte, passava pelos
subúrbios, as luzes da cidade iam diminuindo aos poucos, o embalo do trem
conduzia a um sono tranquilo. Estávamos no último carro e as curvas faziam as
malas deslizarem na cama em ritmo de percussão. Já estava dormindo o primeiro
sono, quando senti uma trepidação diferente, o corpo sacudido de todos os
lados, as malas caindo.
Barulho, choque, poeira, o teto balançava, rodava,
vidros se espatifando, escuridão, fumaça. Depois do choque maior, um silêncio
de morte. Será que morri?
Comecei a apalpar meus braços, pernas, para ver se
estava viva. Escuridão total, disparo do coração e a busca angustiante da vida
que poderia escapar.
Pensei comigo mesma – “estou viva, estou sentindo
dor no braço e muito peso nas pernas.
De repente o silêncio é rompido com o grito
histérico de uma mulher. O grito era tão assustador que eu quase morri de
susto. Mas pensei : “Se estou ouvindo é porque estou viva.
A criança embaixo chorava, a mãe se agarrava a ela
chorando no escuro, por cima das malas.
Em seguida, a voz do chefe do trem orientando os
acidentados:
“Não se assustem, o trem capotou, estamos com as
rodas para cima, mas graças a Deus, não rolamos no abismo.
“Deus ajudou, pensei, estamos salvos”
Sair do trem foi uma cena dantesca, saímos pelas
janelas, auxiliadas por um grupo de políticos que viajava no vagão da frente.
No escuro, pude escutar vozes conhecidas, o Dr
Franzen de Lima, que me socorreu, e o Dr Maurício Bicalho. Fomos levadas para o
vagão dos políticos e seguimos viagem aglomeradas, em cima de algumas malas. As
outras ficaram no vagão acidentado, para serem procuradas mais tarde. O médico
de bordo nos atendeu para os curativos. Felizmente ninguém morreu.
Ainda me foi possível chegar a tempo para a entrega
de prêmios, com o braço engessado.
O sonho de papai se realizou, mas a interpretação
que ele deu, não conferiu.
*Fotos da internet
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segunda-feira, 22 de janeiro de 2018
ACIDENTE I
Meu primeiro acidente, do qual escapei com vida, foi
aos 5 anos de idade, em casa do meu avô paterno, na rua Piauí com Cláudio
Manoel. Ali se reuniam as pessoas importantes da família, uma quantidade de
homens de terno e colete. Conversavam na sala em torno de uma mesa enorme,
enquanto minha avó servia cafezinhos com biscoitos e bolinhos. Meu tio avô era
governador do Amazonas, naquele tempo governador era chamado de presidente.
No
dia do meu acidente, havia um vozerio na sala, meu tio acabava de chegar do
norte do país, trazendo brinquedos lindos para os sobrinhos, bonecas, carrinhos
e uma série de maravilhas guardadas com o maior cuidado em cima de um armário.
Na minha "pequenês" de 5 anos, eu só podia ver a perna
e o sapatinho de uma boneca que ele trouxera do Amazonas. Fiquei olhando o
sapatinho da boneca, a roupinha cheia de babados, aquilo era uma tentação!
Ver a boneca de baixo para cima, sem poder segurá-la
em minhas mãos, era muito para a minha impaciência. Resolvi então me aventurar a
subir pelas 5 prateleiras vazias. Por que mamãe não colocou a boneca na primeira
prateleira? O quarto era estreito e comprido, o armário estava quase vazio,
segurei com a maior coragem a prateleira de baixo, tentei alcançar a segunda
prateleira.
Depois, não vi nada, apenas um barulho ensurdecedor, muita poeira e
muita paulada nas costas. As prateleiras foram despencando em cima de mim e se
escorando na parede em frente, eu lá embaixo, encolhida.
O armário caiu também
com estrondo e esbarrou na parede da frente do quarto, levantando muita poeira. Foi difícil sair
daquele esconderijo.
Só sei que os políticos vieram todos me ajudar a sair dos
escombros. Toda suja, empoeirada e chorando.
Fui levada para o jardim em frente, onde tinha um
laguinho com peixes. Minha tia me deu água com açúcar e me passou o maior pito.
“Você nasceu de novo, podia ter morrido”.
Enquanto eu ganhava os conselhos de tia Lilita,
outra turma ia socorrer o presidente do Amazonas, que quase teve um enfarte de
tanto susto.
Fotos da internet
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terça-feira, 16 de janeiro de 2018
PORTO TROMBETAS, BRASIL, FRANÇA
Em julho de 1989, eu me encontrava em Porto
Trombetas, no Pará, à convite do Colégio Pitágoras, afim de realizar ali um
workshop de 25 dias para 25 professoras.
A intenção era trabalhar a arte em seu processo
criativo. Escolhi como tema a sinopse do meu livro “Os Caminhos da Arte”, uma
visão holística da arte considerada sob o ponto de vista de transformadora da
sociedade.
Com o auxílio de minha filha Ivana, que viajou
comigo para Porto Trombetas, consegui montar um esquema de trabalho um pouco
planejado e muito improvisado, contando sempre com a ajuda das alunas e dos
recursos que encontrávamos no local.
Todas as aulas contando a história do planeta desde
os mitos de criação até a arte contemporânea, foram vivenciadas com o auxílio
de painéis coletivos feitos em papel Kraft e pincel atômico, tintas, argila,
tocos de madeira e outras coisas coletadas nas ruas da cidade, descartadas pelo
consumo.
Algumas vezes fazíamos teatro e os alunos produziam
o cenário, os próprios figurinos e
adereços e criavam uma cena. Usando a criatividade, eles nunca se esqueceriam
dos fatos históricos.
Assim fomos passando pela história e vivenciando o
passado artístico de nosso planeta.
Muitas vezes usávamos música, dança, relaxamento,
discursos, manifestos. Uma das vivências mais interessantes foi a realizada por
um grupo de alunos em homenagem ao dia 14 de julho.
Fizemos um painel coletivo,
um desenho de 2 metros, representando duas grutas, uma no Brasil e a outra na
França, com os seus desenhos pré-históricos.
Houve uma comunicação muito intensa entre os dois
países, mostrando a semelhança dos homens pré-históricos, separados por muitos
mares, mas unidos ali, no mesmo contexto histórico.
Com este painel coletivo ficou registrada a
semelhança do traço e da escolha dos mesmos temas, mostrando a unidade que
existe entre os diversos povos da terra.
No final de cada experiência, trocávamos idéias,
discutíamos sobre as semelhanças e contrastes entre os dois países.
O trabalho foi realizado no dia 14 de julho, e ali
mesmo prestamos homenagem àquele país amigo.
Os desenhos das duas cavernas, uma em Lagoa Santa,
Minas Gerais, e a outra em Lascaux, na França, nos permitiram tomar consciência
de que a terra é a mesma e os povos se assemelham, reproduzindo os desenhos
rupestres deixados por nossos antepassados. Também pudemos sentir um elo de
ligação entre a França e o Brasil.
*Fotos da internet
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segunda-feira, 8 de janeiro de 2018
CARTA DA ÍNDIA PARA A FAMÍLIA III
"22 de dezembro de 1977
Estamos pesquisando contrastes e semelhanças entre
a Índia e o Brasil. Isto faz parte do estudo do Maurício, mas podemos ajudá-lo
na parte de arte e artesanato e também na observação dos costumes.
O artesanato é a via artística mais diretamente
ligada à alma do povo, aos seus costumes e tradições. O artesanato hindu é
riquíssimo e abrange uma dimensão bem grande dentro de uma variedade de
concepções estéticas que muitas vezes, espontaneamente se aproximam das nossas.
Vamos descobrindo coisas. Aquele elefante de palha
em casa do secretário da embaixada, nos lembra também outros bichos de palha,
tecidos pelas mãos dos chilenos, no outro lado do mundo.
Há talhas de madeira, com formas humanas rebuscadas
como os trabalhos de GTO (Geraldo Teles de Oliveira), há colares de prata
semelhantes aos nossos trabalhos de Tiradentes. Hoje vi no Museu de Arte
Moderna, desenhos parecidos com os de Marília e outros com os desenhos de
Ivana. Uma das pinturas, uma grande Mandala, faz lembrar meus próprios quadros.
Isto nos faz conscientes de que as inspirações dos artistas se assemelham,
colhemos ou captamos vibrações semelhantes em regiões diversas do mundo.
Existe a separação criada pela distância e a língua,
mas as manifestações mais profundas da
alma são semelhantes entre os seres humanos.
Um grande abraço e muitas saudades,
Sua mãe
Helena”
*Fotos da internet e de arquivo
terça-feira, 2 de janeiro de 2018
CARTA DA ÍNDIA PARA A FAMÍLIA II
Transcrevo abaixo cartas da Índia para minha mãe Nair,
minha irmã Maria Regina, e para os filhos que ficaram.
CARTA 1:
Maria Regina e Azulino,
Hoje é o último dia de 77. Desejo para vocês um 78
muito feliz no novo apartamento.
Abraços muito saudosos,
Helena
Este abraço é para o Paulo
E este é para a Adriana.
CARTA 2:
Para mamãe,
Da Índia, um abraço saudoso da filha Helena.
CARTA 3:
Marília, Paixão, Ivana, Euler e Artur,
Para Marília e Paixão, com saudades.
Para Vaninha querida, neste Ano Novo da Índia.
Para o Euler, sempre lembrado.
E o meu Tuzinho, meu beijo de cá de longe.
Com Krisna e Radha, meu abraço de Boas Festas.
Todos juntos lembramos o Brasil
*Fotos de arquivo
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