segunda-feira, 20 de maio de 2019

UM RETIRO NOS HIMALAIAS – PRINCÍPIO DE VIDA


Estamos na primavera. Sobre a terra molhada, o sol começa a surgir. Surge também, dentro de mim, um novo sol. Lembro-me da experiência que tive quando li Krishnamurti pela primeira vez. Comprei um livrinho no aeroporto, estava a caminho de Brasília, que eu iria visitar  pela primeira vez em 1973. 17 anos se passaram. Li o livro durante a viagem e continuei lendo a noite toda até de madrugada. Quando acabei de ler, o sol nascia, muito vermelho, enorme. Surgia para sempre, um novo sol dentro de mim.

Krishnamurti nos desperta para sermos nossos próprios mestres e nossos próprios discípulos. Dispensa todas as seitas e gurus. O trabalho conosco não é num consultório de análise. É a própria vida nos ensinando, momento por momento.
“O problema deve ser percebido quando está acontecendo, não antes nem depois, como memória ou como um exemplo. A percepção é instantânea; você entende uma coisa instantaneamente ou nunca: o ver, o escutar, o entender são instantâneos”.
Neste momento estou vendo, escutando e sentindo o perfume da primavera. Daqui a alguns instantes esta percepção se torna apenas memória e outra surgirá num novo momento.

A memória é produto da mente, e nos depósitos do inconsciente procuramos ressurgir o que já morreu. Mas nunca ele nascerá novamente com a mesma intensidade. Morte e vida são um único movimento. A cada instante nascemos e morremos.
“A percepção só pode nascer do silêncio e não da mente falante”.
Somente uma mente quieta pode perceber os movimentos exteriores e interiores, o que se passa fora e dentro de nós ao mesmo tempo.

O movimento da mão escrevendo, o quarto com duas camas, livros espalhados, o sol entrando pela janela, pássaros cantando lá fora, o jardineiro abrindo canteiros. O dia se torna cada vez mais claro e com a presença do sol, o panorama externo vai mudando momento por momento. Também internamente, a nossa paisagem muda.
“Estarmos conscientes de nossa desatenção é de grande importância, não existe método para se estar atento o tempo todo. A prática de estar atento é desatenção”.
Subimos o morro para ver a paisagem. Há uma floresta de pinheiros bem no alto e para chegar até lá, passamos por casebres de camponeses, sempre curiosos da nossa presença. Trazem cadeiras para a gente sentar e as crianças nos olham com admiração. As camponesas carregam potes dourados sobre as cabeças e nas orelhas, brincos que refulgem ao sol.

As mulheres na Índia, desde criança, vão guardando dinheiro para comprar joias que serão dadas como dote quando os pais encontram um marido para as filhas. Se não tiverem dote, não se casam. Tiramos fotos em frente às casas, junto às vaquinhas. Nossa caminhada continuou morro acima, vendo os campos de trigo lá embaixo, como os quadros de Van Gogh. De lá pudemos ver nossas cabanas espalhadas pelo retiro, cada uma guardando uma presença. Cada um de nós descobriu o seu pinheiro, na dimensão certa de sua própria vida. Abracei um deles certa de que era o meu e, quando olhei para cima ele se desdobrava em muitos galhos. O de Marília Paleta subia sozinho em direção aos céus.

“ A morte é parte da vida. Pode-se viver com a morte e entender o significado do fim?”
“Morrer para nossos apegos, nossas crenças”.
Todas essas são frases de Krishnamurti.
(Trecho de meu diário de viagem, 1990)

*Fotos da internet

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