Encontrei nos meus arquivos este trecho de um diário
escrito nos anos 80. Segue a transcrição abaixo.
Deixamos Bangalore às 6 da manhã. A quietude do
ashram, o silêncio, o gorjeio dos pássaros. Um pássaro fez as “necessidades” em
minha cabeça, enquanto eu esperava o ônibus.
Crianças, mulheres, homens, moram
em frente ao ashram. Tecem cestos de dia, cozinham à noite, dormem debaixo dos
cestos.
Luta para tomar o ônibus, discussão por causa de
lugar, quase briga. O povo é assim. Ônibus populares são super cheios e saem
por aí balançando com 100 pessoas dentro.
Vim com 3 malas, carregando coisas
desnecessárias, minha segurança, como as tartarugas. Remédios em quantidade.
Deus dá à gente aquilo que a gente precisa no momento e, no momento, por
incrível que pareça, minha segurança está em tomar remédios. Procurando fora o
que vai remediar dentro – remédios, remédios.
Preciso agora me descartar da mania de segurança, de
remédios. Por que tantos embrulhos, pacotes, cobertores? Madras é tão quente,
mas eu quase adoeci, mesmo em Bangalore, com o frio. Agora estou no calor,
lembrando o frio, a chuva de Bangalore. Um ventilador e eu suando, suando. Será
que as doenças não vêm do medo do entorno?
O ashram de Ramana Maharish na cidade de Tiruvanamalai
me deu a lição do que é ser “jnani”, que significa buscar a sabedoria através
do autoconhecimento. “Quem sou eu?” É o mantra repetido por todos. Chegamos às
2 e meia da tarde, cansados, com fome. Fomos recebidos com a maior
cordialidade. Os velhinhos andam quase nus, como Ramana. Um deles veio até nós.
Convidou-nos a fazer nossa inscrição.
Almoçamos sentados no chão e o velhinho nos serviu.
Alto, os pés inchados, os olhos transmitindo paz. Colocou no chão o prato de
folha. Veio um jovem moreno com arroz, verduras, coalhada, leite, água. Há a
preocupação de SERVIR. Reparei isto – poucas palavras, mas o exemplo da
verdadeira “Jnana Yoga”, Yoga da Sabedoria. Tudo é baseado no autoconhecimento.
Somos iguais. O hóspede é visto como parte do Todo – parte de nós mesmos. Outra
nota: primeiro o bem estar do hóspede. Não há uma organização a preservar. Chegamos
com atraso de 2 horas e fomos servidos com o maior carinho.
A tônica é o SILÊNCIO. Escutar o SILÊNCIO. O
conhecimento intelectual nos coloca falando, falando. O conhecimento de nós
mesmos nos conduz ao silêncio. Paz. Não há necessidade de grandes explanações,
mas a gente sabe que ali moram sábios.
*Fotos da internet
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